Mauro Motta, compositor e produtor dos discos de Roberto Carlos, autor de vários sucessos de Roberto, como ‘De coração pra coração’, ‘Eu e ela’, ‘Nosso amor’ e ‘Você mexeu com a minha vida’, do último LP, conversa com a gente sobre seu trabalho com o maior nome da música popular brasileira.
* Mauro, você participa, todos os sábados, do ‘Programa Francisco Barbosa’, na Rádio Globo, e há cerca de um mês, você selecionou as músicas de
Roberto de que mais gosta. Quais são elas? "MM" – ‘Detalhes’, ‘Emoções’, ‘Proposta’, ‘Outra vez’, ‘Falando sério’, ‘Força estranha’, ‘Os seus botões’, ‘Olha’ e ‘Como vai você’. * Quando Roberto começa a preparar o seu disco de fim de ano? "MM" – Geralmente em maio, quando nós começamos a escolher as músicas. Mas só começamos a gravação no final de julho e aí o trabalho vai até dezembro. * Quando você conheceu o Roberto Carlos? "MM" – Eu conheço o Roberto desde 1966 e quem me apresentou a ele foi o Hélio Justo, que fazia músicas para o Roberto Carlos. Como eu tocava teclados no conjunto ‘Renato e Seus Blue Caps’, gravei em muitos discos do Roberto, quando ele gravava no Brasil. Em 77, eu comecei a viajar com o antigo produtor, o Evandro Ribeiro, ex-presidente da CBS, e já ajudava nas produções. Com a saída do Evandro, que se retirou por não querer mais produzir músicas, eu comecei a produzir diretamente os discos, em 1984, a partir do LP ‘Caminhoneiro’ que, inclusive tem a minha música ‘Eu e ela’. * Quando o Roberto Carlos entra no estúdio para gravar, as músicas já estão escolhidas? "MM" – Não. A gente tem algumas canções definidas, geralmente as canções dele. Muitas estão com as letras prontas e outras vão sendo aprontadas durante a gravação. * O motivo das gravações de Roberto Carlos serem no exterior deve-se à tecnologia norte-americana ou é porque lá ele tem mais tranquilidade? "MM" – Sem dúvida, a gravação lá fora é por causa da tecnologia. Há algum tempo atrás, os estúdios brasileiros acompanhavam os dos Estados Unidos e da Europa. Mas, com a situação econômica do país, os estúdios não estão bem aparelhados como antes e alguns deles estão até fechando. * O que houve com o disco de 89, ‘Amazônia’ que você não terminou? "MM" – Eu estava bastante estressado física e emocionalmente e ficou muito difícil terminar o trabalho. Na verdade, o disco chegou a um ponto em que eu não estava sendo útil ao trabalho do Roberto e resolvi não terminar para não atrapalhar o resultado final. O Roberto entendeu perfeitamente, pelo lado humano, e, no ano seguinte, nós retornamos ao trabalho. * Por que Roberto Carlos não gravou nenhuma música do Carlos Colla este ano? "MM" – O Roberto tentou gravar alguma música do Colla, mas o problema é que o trabalho do Carlinhos não estava combinando muito com a linha do disco. Há inclusive uma música de que gosto muito, e que o Roberto Carlos também é apaixonado que se chama ‘Filme de Godart’, do Colla com o Marcos Valle. Nós tentamos gravá-la, mas havia problemas de região de voz para a construção melódica e não chegamos a um acordo. Pode ser que, no ano que vem, a gente a grave porque a música é lindíssima. Isso é normal. Pena que o Carlinhos não tenha encontrado uma canção que combinasse com o trabalho, mas o Roberto tem uma admiração, um carinho, um amor eterno pela pessoa, pelo artista e pelo compositor Carlos Colla. * Das músicas que você compôs para o Roberto Carlos, qual a de que gosta mais? "MM" – Por incrível que pareça, há uma canção de que gosto muito e que não fez sucesso: ‘Eu voltei ao passado’. A melodia e a letra têm um sentido muito bonito. Mas não posso dizer que essa é a mais bonita, já que gosto de todas e fica difícil destacar qualquer uma. Cada música foi feita em um momento diferente e por isso, todas são marcantes. * Conte detalhes de ‘Emoções’, uma das marcas da carreira de Roberto Carlos? "MM" – O Roberto chamou o Torrie Zito, que é um dos maiores arranjadores dos Estados Unidos, já tendo trabalhado com o Tony Bennett e com o Frank Sinatra. Ele é um grande maestro e uma simplicidade tão grande quanto o seu talento. O Torrie é aquele tipo de pessoa que a gente olha e não acredita que ele seja capaz de fazer um arranjo como o de ‘Emoções’ e o de outras músicas. O Roberto Carlos passou a ideia que tinha da música de uma ‘big band’. No dia da gravação de ‘Emoções’, o Roberto se atrasou um pouco e chegou no estúdio dez minutos depois da hora marcada e a primeira passada da música já estava pronta. Quando ele escutou levou um susto porque era mais ou menos aquilo que ele queria. Um detalhe curioso é que depois de termos gravado ‘Emoções’ ao voltarmos do estúdio para o hotel, caminhando pela rua, numa noite muito fria, o Roberto perguntou se no final não devia ter usado os trompetes dobrando com os saxofones e eu disse que não porque aquele final dá uma ideia de sonho para as pessoas refletirem e lembra um pouco a banda do Glen Miller. * O Roberto dá muito palpite no seu trabalho. Podemos chamá-lo de co-produtor dos discos? "MM" – Nenhum artista pode se auto-produzir. É lógico que o Roberto tem uma condição e uma visão muito grandes do seu trabalho, mas ele, como qualquer outro artista precisa de uma pessoa ao seu lado, ajudando a decidir e a definir as coisas. O Roberto se quiser produzir outro artista, vai fazê-lo muito bem, já que tem uma noção muito grande de ritmo, de base e de arranjos. Ele é um homem de muito bom gosto nas coisas que sugere e sempre dá palpite no que gosta. * Parte da imprensa critica o trabalho do Roberto Carlos, você, como produtor, sente-se atingido? "MM" – O artista, às vezes, tem um senso mais crítico do que o próprio crítico, e o Roberto, com sua experiência, sabe o que faz. Por isso, ele não se incomoda muito. Mas eu não concordo com as opiniões de que ele tem que mudar, porque seria muito perigoso trair o que fez em toda a sua carreira. Se o Roberto encontrou o seu caminho, que é a coisa mais difícil para um artista, por que tem que trocar isso se o seu público já se encontrou no seu trabalho? Ele tem mais é que segurar a sua linha. * Para terminar, Mauro, que nota você dá para o cantor e compositor Roberto Carlos? "MM" – Quem sou eu para dar nota ao Roberto Carlos?! Ele é o Rei, entre muitas coisas, da glória que alcançou em sua carreira, que é um recorde dentro do mundo do disco. Nenhum artista, dentro do seu próprio país, e podemos incluir aí o Elvis Presley, os Beatles, Frank Sinatra, conseguiu ficar dentro de seus próprios países como Roberto Carlos, que está há mais de 20 anos em absoluto primeiro lugar nas paradas de sucesso. Que nota a gente dá a um artista como este? E depois, a gente não pode dar nota a ninguém, só Deus é que pode dizer o que a gente tem a merecer. "justify"> |