MAURO MOTTA
entrevista concedida a Carlos Eduardo F.Bittencourt para o
Grupo Um Milhão de Amigos

31.01.1998




A cada lançamento de discos de Roberto Carlos conversamos com Mauro Motta,
o produtor de seus trabalhos desde 1984.
Agora vamos ouvi-lo sobre o mais recente CD de Roberto Carlos, “Canciones que amo”,
que levou três anos para ser concluído.

* Nestes três anos sendo gravado, quais foram as dificuldades que vocês encontraram?
"MM" – O maior problema foi a falta de tempo do Roberto, por causa dos shows e dos lançamentos dos discos em português nos anos anteriores. Ao mesmo tempo que escolhia as canções para este CD, ele tinha que dar seguimento aos seus compromissos profissionais. Roberto acabava não podendo acompanhar de perto a escolha das músicas e a gravação instrumental. Bebu Silvetti, o outro produtor, mandava uma fita do que havia sido feito, e nos intervalos dos shows Roberto ouvia. Se não gostava, tinha que mandar de volta para os Estados Unidos para ser refeito, e por isso o trabalho demorou tanto.

* Como foi feita a divisão da produção do CD entre você e Bebu Silvetti?
"MM" – Roberto, Bebu e Tomas Muñoz, diretor executivo do disco e quem teve a ideia de lançá-lo, escolheram o repertório. Nisso eu não tive nenhuma participação. Eu só participei na colocação das vozes, todas, como sempre faço nos discos em português e na produção das quatro canções que tiveram que ser regravadas aqui. No geral dei alguns palpites no disco, nas canções, na mixagem. Uma coisa que gostaria de falar é que eu não conhecia a grande maioria dessas músicas.

* Quando Roberto Carlos e a Sony Music decidiram lançar o disco aqui no Brasil houve algum receio de que ele não fosse bem aceito pelos fãs, já que pela primeira vez Roberto deixaria de lançar um disco anual em português?
"MM" – A ideia era lançá-lo mundialmente e também aqui no Brasil explorando um lado pouco conhecido pelos fãs brasileiros. Não sei por quais razões a Sony não lança aqui os discos em espanhol e italiano que Roberto Carlos grava. Eu acho isso um erro enorme. Eu, que os produzo, muitas vezes quero um determinado disco em espanhol e não consigo. Já pedi várias vezes à Sony do Brasil e nunca me cederam, nunca tiveram essa gentileza comigo. Se eu que participo de alguns discos em espanhol não consigo, imagine o público, que não tem acesso à gravadora. Então achei muito legal a ideia de se lançar o disco aqui no Brasil porque mais do que ninguém os fãs merecem, e o grande público de Roberto está no Brasil. Portanto achei que seria legal que todo mundo aqui ouvisse esse disco.

* Roberto já tinha começado a trabalhar no lançamento em português no ano passado?
"MM" – Nós íamos começar o disco em português mas não deu tempo. A princípio nos iludimos e pensamos que daria tempo para terminar esse disco e trabalhar no CD em português, mas foi só um sonho. Deus não quis que fosse dessa forma.

* Nos discos anteriores vocês sempre começaram o trabalho pela música religiosa. Nesse disco não foi assim, não é?
"MM" – Isso não é obrigatório nem qualquer superstição mas gostamos de iniciar o trabalho pela mensagem. E, particularmente, gosto muito porque a primeira produção que fiz foi um disco de hinos religiosos católicos. Um dos grandes sonhos da minha vida e compor em louvor a Deus, algo que não tivesse nada de comercial. Tenho muitas canções assim, umas de que até gosto muito. Qualquer coisa que fale de Deus, para mim, tem sempre preferência. Não digo que seja para atrair bons fluidos porque acho que agente atrai bons fluidos sempre que começa um trabalho honesto com qualquer música. Não precisa ser necessariamente falando de Deus. Mas se falar de Deus é melhor!

* Será que pode existir uma parceria sua com Roberto Carlos em mensagens religiosas?
"MM" – A gente tem uma quatro ou cinco músicas para terminar e sempre cobramos um do outro para acabar as canções. Mas não acabamos nunca. É falta de tempo mesmo.

* A música “Coração de Jesus” foi gravada em castelhano para ser lançada no exterior como Roberto, na coletiva à imprensa, disse que seria?
"MM" – Não, não chegamos a fazer a gravação. Não deu tempo de Roberto colocar a voz em espanhol porque logo após o lançamento do disco aqui no Brasil ele começou a se dedicar ao Especial de fim de ano da Globo. Eu já tinha até gravado o coro, em Miami. O disco foi lançado no exterior com “Coração de Jesus” em português.

* Por que o Eduardo Lages refez os arranjos de três músicas que haviam sido produzidas lá fora?
"MM" – Tivemos que regravar algumas canções porque elas tinham um tipo de composição rítmica e harmônica e queríamos testar um andamento diferente. Daí chamamos o Eduardo Lages, que é um maestro mais do que aprovado no trabalho do Roberto Carlos.

* Fale um pouco sobre a versão em castelhano de “Insensatez” e porque ela entrou no disco?
"MM" – Cada vez mais as canções do Tom Jobim são conhecidas no mundo inteiro. A música “Insensatez” é uma obra de arte. Roberto pensou que pudesse fazer um trabalho bonito num duo com o Julio Iglesias, mas o Julio queria uma canção mais conhecida popularmente. Como não achamos uma canção para que ele fizesse o dueto, Roberto acabou gravando a música sozinho. Pensamos também em gravar com Natalie Cole mas na última hora ele não encontrou espaço na agenda para colocar a voz.

* Por que a regravação de “Esta tarde vi llover”?
"MM" – Eu acredito que ele regravou porque muita gente não teve acesso a esse disco, e, com o passar dos anos, a gravação original ficou defasada em termos de qualidade. O arranjo original de “Esta tarde vi llover” é muito bonito. Na verdade é uma canção que é para sempre. Para mim a razão foi a defasagem da sonoridade.

* Já há planos para o primeiro disco do Roberto no estúdio Amigo?
"MM" – Assim que o estúdio estiver pronto começaremos a trabalhar. Assim poderemos ir adiantando o trabalho, gravando uma música hoje, voltando daqui a uns dez dias para colocar um solo... Com isso teremos mais tempo para escolher com calma a qualidade do disco.

* Vamos falar um pouco de cada música?

Abrázame así
"MM" – Acho o arranjo e melodia muito bonitos. Eu me lembrava vagamente dela mas não é uma música que lembre os meus tempos de infância. Eu estou com 48 anos e creio que essa música tenha sido sucesso em 1952 ou 1953, talvez até antes. Lembro-me de canções de quando eu tinha meus dois ou três anos. Recordo-me bem de Gregório Barrios cantando “Luna lunera” e outras canções, mas não me lembro de “Abrázame así”, que talvez nem tenha sido um grande sucesso.

Adios
"MM" – É fantástica, uma obra-prima. Lembro-me da gravação no disco “Don Costa Vozes e Trombone”.

Niña
"MM" – É uma canção do Bebu Silvetti, e de sua esposa Silvia Ibañes, uma música e uma letra muito bonitas, com uma melodia muito forte.

Insensatez
"MM" – Essa é uma obra-prima de Tom e Vinícius. Foram feitas várias versões, sendo que a mais próxima da letra original foi a do Luis Escolar.
Mesmo assim não era a ideal e por isso Roberto fez uma readaptação. A letra original tem uma passagem que diz “quem nunca amou não merece ser amado” e Roberto colocou o contrário na versão. Não me lembro bem as palavras mas ele diz que quem nunca amou é que merece ser amado. Concordo!

Las muchachas de la Plaza España
"MM" – A gravação original dessa música, lindíssima, é do Lucho Gatica. Eu e o Roberto ouvimos muito a canção no estúdio quando estávamos gravando o disco. Como ele canta bonito! O curioso é que essa música não fez sucesso no Brasil, apesar de ter sido tema de um filme. Na verdade a Plaza Espana não fica na Espanha, fica em Roma.

El manicero
"MM" – Para quem não sabe, “manicero” é vendedor de amendoim. Aquela parte do início, que tem a letra arrastada, é o pregão do tipo “olha aqui o amendoim”. Na gravação original o cantor, não me lembro seu nome, canta aquele “mani” analasado. Quando eu era criança e ouvia meu pai cantar, me passava um som nostálgico e eu achava aquilo triste. Eu pensava que “mani” era o nome de uma mulher que tinha ido embora. Quando conversei com Roberto vi que ele tinha a mesma impressão.

Coração de Jesus
"MM" – É uma música bonita, como sempre, dentre as canções religiosas que Roberto e Erasmo escrevem. Não preciso dizer muita coisa.

Mi carta
"MM" – Foi uma das canções que regrávamos com o Eduardo Lages. A gravação estava muito boa mas queríamos uns compassos a mais para o Roberto ter um pouco mais de respiração. O resultado ficou muito bom. Eu me lembrava vagamente da gravação do Roberto Ianez, que cheguei a pegar na Rádio Globo para ouvir e ter uma ideia de como era.

Esta tarde vi llover
"MM" – É uma música que já comentamos mas vale acrescentar que é uma obra-prima de Armando Manazero.

Se me olvido otra vez
"MM" – Também é uma canção bonita, uma música tipo rancheira mexicana. Como sou apaixonado pelo México e pelo povo mexicano, gosto muito dessa música.

* Mauro, como é feita a ordem das músicas no CD?
"MM" – Normalmente quem faz a escolha sou eu, partindo de um princípio de colocar as músicas que consideramos as mais fortes pela beleza. E chega a um ponto que além da beleza das músicas, que é uma coisa muito subjetiva, também conta muito o ritmo do disco. Não se pode colocar juntas muitas canções lentas e depois muitas canções com balanço. Tem que haver um meio-termo. No caso desse CD também contou muito a importância da gravação original de cada música, do sucesso que teve em determinada época.

* Quando vocês recomeçam o trabalho com Roberto Carlos?
"MM" – Acredito que dentro de uns dois meses, mas o Roberto tem planos de fazer, este ano, um projeto especial e, de repente, a gente pode iniciar logo isso. Sempre é um prazer muito grande trabalhar com Roberto Carlos.

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