MILTON GUEDES
entrevista concedida a Carlos Eduardo F.Bittencourt para o
Grupo Um Milhão de Amigos

01.08.2002




Milton Guedes vai nos falar de sua participação na gravação do DVD 'Acústico MTV'
e também em outras músicas gravadas por Roberto Carlos em estúdio.

* Milton, conte-nos como foi o início de sua carreira.
"MG" – Eu comecei minha carreira em 1985, tocando harmônica e sax nos barzinhos de Brasília. Um dia o Oswaldo Montenegro assistiu a uma apresentação minha e me convidou para vir ao Rio participar de um espetáculo que ele estava montando. Foi tudo muito rápido. O convite foi na sexta-feira e na segunda eu já estava no Rio. Fiquei três anos tocando e participando dos musicais do Oswaldo e também em bares do Rio. Em 1988, quando eu participava da gravação de um disco de uns amigos nos estúdios da BMG, conheci o Lulu Santos, que estava gravando o disco ‘Toda forma de amor”. Ele me viu tocando e gostou. O Lulu estava montando uma banda pois tinha desfeito a anterior porque os músicos foram tentar carreira solo e me convidou para participar da nova banda. Eu toquei oito anos com o Lulu Santos. Daí começaram a surgir convites para gravar e participar de shows de outros músicos. O mais legal disso tudo foi que tive a oportunidade de gravar com meus grandes ídolos, com pessoas que sempre admirei.

* O que significa na sua carreira ter gravado com Roberto Carlos?
"MG" – Significa muito, a realização de um sonho, o privilégio de participar dos discos de um dos maiores nomes da música brasileira. Um dia eu recebi a ligação do Eduardo Lages me chamando para fazer o solo numa música do Roberto Carlos. Isso foi em 1996. A música era “Quando eu digo que te amo”. Foi uma alegria imensa, posso até dizer que me deu até uma certa “amarelada” na hora de gravar. Gravar com ele engrandece o currículo de qualquer artista, e recebi aquele convite com um grande susto.

* Você ficou tranqüilo quando entrou no estúdio?
"MG" – É claro que não. No começo eu fiquei muito nervoso e logo veio à minha cabeça a dúvida se ele iria gostar, se eu iria conseguir fazer o solo que ele queria. Essa foi a primeira sensação que tive desde o momento que recebi o convite.

* Roberto estava presente quando você gravou “Quando digo que te amo”?
"MG" – Ele estava e acompanhou tudo. Isso mostra o carinho que Roberto tem com os seus discos. Posso até dizer que foi Roberto quem dirigiu um pouco a minha gravação. Primeiro trabalhamos uma linha de solo. Ele queria uma coisa bem forte. Achei legal porque ele me pediu várias opções para que pudesse escolher uma. Algumas pessoas já tinham me falado que Roberto gosta de gravar em vários canais para ter diferentes opções de gravação. Quando achamos um desenho de solo que o agradou começamos a trabalhar em cima, fazendo outras variações.

* Antes de gravar “Quando digo que te amo” você já tinha trabalhado com o Roberto?
"MG" – Eu gravei o solo de sax na música “Desabafo”, que Roberto gravou com a Ângela Maria num disco de duetos que ela lançou. Também acompanhei os dois no Especial do Roberto de 1995, gravado no Metropolitan (ATL-Hall). Na gravação da música eu não tive nenhum contato com ele mas nos encontramos na gravação do Especial. Foi a primeira vez que Roberto Carlos me viu tocando. Algumas pessoas já haviam comentado que ele havia gostado do solo de “Desabafo”. No dia da gravação do Especial, no Metropolitan, nós conversamos durante a passagem de som e ele me fez muitos elogios. Foi muito bacana e muito importante receber seu reconhecimento. Acho que a minha participação naquela música fez com que as portas se abrissem para que eu pudesse participar de outras gravações dele.

* Você se recorda de todas as musicas que já gravou com ele?
"MG" – Além de “Desabafo”, no disco da Ângela Maria, e de “Parei na contra-mão”, no CD Acústico, também participei das músicas: “Quando digo que te amo”, “Eu te amo tanto”, “Vê se volta pra mim” e “O grude (um do outro)”.

* Houve algum solo que você tenha feito seguindo a sugestão de Roberto Carlos?
"MG" – Teve, o da música “O grude”. Quando cheguei no estúdio o Eduardo Lages me disse que o Roberto tinha feito um solo assobiado mas que não queria me mostrar porque o achava muito simples. Eu já tinha ouvido falar que Roberto Carlos assobia muito bem mas não imaginava que ele fosse super afinado. Antes de me mostrar a gravação do assobio ele me pediu para que não reparasse, que serviria apenas como uma referência. Eu quase não acreditei no que ouvi, fiquei impressionado com a sua afinação. Cheguei a sugerir que ele gravasse a música assobiando mas ele não quis. Então eu fiz questão de tirar o mesmo solo que ele fez, apenas fazendo a adaptação para o saxofone.

* Milton, você tem algum solo que considere especial?
"MG" – Gosto muito da minha participação na música “Eu te amo tanto”. Roberto queria uma linha melódica muito forte. Mostrei várias opções para que ele pudesse escolher uma. Nunca me esqueço que um dia no estúdio estávamos trabalhando nessa música e Roberto me levou para um canto, dizendo que gostava de insistir tanto em gravar várias opções porque considerava que o solo é o que existe de mais importante na música depois da voz. Para ele o solo é um complemento da voz, por isso ele insiste em gravar várias vezes até achar o ideal. Nunca mais me esqueci dessa conversa porque jamais havia pensado nisso. Talvez esse solo seja o que mais gosto, o que coloquei toda a minha emoção. Também gosto muito do solo de “O grude” mas ele estava quase pronto no assobio do Roberto e um solo preparado acaba ficando mais técnicos.

* Como é o Roberto Carlos no estúdio?
"MG" – Ele é uma pessoa muito tranqüila, generosa e paciente, que se for preciso passa horas e horas trabalhando numa mesma música. Roberto pode não admitir mas ele é um super músico, ele conhece muito de música, tem melodias maravilhosas. Trabalhar os solos com ele, ouvindo seus palpites, é melhor ainda.

* Você sabia que Roberto Carlos já chegou a tocar gaita em público e até gravou a música “O diamante cor-de-rosa” tocando harmônica?
"MG" – Eu já ouvi a música e percebi que ele toca harmônica muito bem. É claro que cada um tem um estilo, um jeito diferente de tocar. Roberto poderia ter tocado gaita na gravação de “Parei na contra-mão” no disco acústico. Eu até sugeri que juntos fizéssemos o solo mas ele não quis.

* Quem toca harmônica melhor, você ou Roberto Carlos?
"MG" – Perguntar isso é até covardia. Roberto toca muito bem, na música “O diamante cor-de-rosa” percebe-se que ele tem uma noção do instrumento. Pelos solos de assobio que faz também percebe-se sua afinação. É uma pena que ele não toque gaita em público mais vezes.

* Como surgiu o convite para participar do Acústico?
"MG" – Foi o Guto Graça Mello quem me convidou. Quando ele conversou comigo me contou que tinha sugerido ao Roberto que ele fizesse o solo de gaita na música mas que o Roberto não quis alegando que não tocava gaita havia muito tempo. Então o Guto sugeriu o meu nome e parece que Roberto adorou a ideia. Quando fizemos a passagem de som ele gostou muito da minha participação. Eu considero que a minha presença no disco e no DVD imortaliza minha participação na obra de Roberto Carlos. Foi sensacional para mim.

* Vocês ensaiaram muito antes da gravação?
"MG" – Eu tive apenas dois dias de ensaio com Roberto. É claro que a banda ficou mais tempo ensaiando, acho que quase um mês, mas eu, o Tony Bellotto e o Samuel Rosa só ensaiamos dois dias. Ele sempre foi muito generoso, ouvia nossas opiniões, dava algumas sugestões mas no geral aprovou tudo o que fizemos.

* É verdade que você iria participar de outra música no Acústico?
"MG" – Foi levantada a possibilidade de eu tocar sax em “O grude”, mas essa possibilidade foi logo descartada porque já estava quase tudo pronto, faltando poucos dias para as gravações e não havia tempo para mexer nos arranjos. Quem acabou fazendo o solo de assobio foi o próprio Roberto Carlos. Tocar só uma música foi bacana porque virou uma participação especial no Acústico. Se eu tivesse tocado em mais de uma música acabaria virando mais um integrante da banda, não teria aquela sensação de participação especial.

* Você não acha que sua participação, levantando-se da platéia, descontraiu a gravação? De quem foi a ideia?
"MG" – A ideia foi do Guto Graça Mello. Ele queria que eu me passasse por um fã, sentado na platéia, vendo o meu ídolo cantar e louco para invadir o palco e participar da música. Com certeza esse desejo já passou e ainda deve passar pela cabeça de muitas pessoas. Então, em um certo momento eu não consigo me segurar, invado o palco e participo de uma música com Roberto Carlos. Foi isso que o Guto quis passar na gravação. Mas eu acho que o Guto também teve essa ideia porque não sou muito conhecido do grande público, ao contrário do Tony e do Samuel, que também participaram do Acústico. Eles são artistas famosos e até já gravaram músicas do Roberto Carlos. As minhas participações nos discos do Roberto aparecem nas fichas técnicas dos CDs mas pouca gente pára para ler o nome dos músicos. Se você reparar no DVD o Roberto Carlos chama o Samuel e o Tony para subirem no palco, enquanto eu “invado” o palco e o Roberto faz até uma brincadeira, como se estivesse levando um susto. Até nos ensaios eu fiz questão de ensaiar assim, sentado na primeira fila e subindo para fazer o solo.

* E a camisa azul, foi sugestão da produção ou uma homenagem ao Roberto?
"MG" – Ninguém me pediu para que eu fosse vestido de azul mas muita gente veio com aquela velha história de que Roberto só recebe quem está de azul, o que é uma grande mentira. Se você reparar, o Tony e o Samuel não estão de azul. Eu percebi que Roberto trata essa questão como uma brincadeira. Sinceramente, eu coloquei aquela blusa porque a adoro, não foi nada intencional.

* Você chegou a fazer algum retoque na sua participação no estúdio depois da gravação?
"MG" – Eu não fiz nada. Inclusive conversei sobre isso com o Guto. Ele me disse que Roberto fez pequenos ajustes no estúdio. Ao ouvir o disco e comparando com o DVD eu percebi que ele mexeu muito pouco no que foi gravado. Ficaria difícil fazer muitas mudanças, pois não haveria como juntar o som do CD com a imagem do DVD.

* Roberto se recusou a tocar harmônica na gravação mas tocou piano. Também foi idéia do Guto Graça Mello?
"MG" – Eu não conheço profundamente Roberto Carlos mas conheço bem o Guto, que chegou a produzir o meu segundo disco. Nos ensaios Roberto ouvia muito a opinião do Guto, sempre foi muito interessado, e o Guto muito à vontade com ele, chegando até a sugerir ao Roberto algumas canções que ele relutava em cantar pois havia muito tempo que não as cantava em público. Roberto sempre atencioso e ouvindo tudo. Deve ter sido uma surpresa geral quando ele resolveu aceitar a ideia de tocar piano. Até vocês do Fã Clube devem ter se surpreendido pois o próprio Roberto Carlos disse na gravação que era a primeira vez que tocava em público. Ele apenas quis mostrar de que maneira compõe suas músicas. No DVD se percebe um certo nervosismo dele ao dedilhar as teclas.

* Qual a importância do Roberto na música brasileira?
"MG" – Critiquem ou não, Roberto conseguiu passar pelo tempo, por tantas gerações com muita integridade. É normal que o artista mude sua linha de canção ao longo dos anos, e além de compositor Roberto Carlos é um intérprete maravilhoso. Sempre que se falar da música brasileira terá que se reservar um capítulo especial para ele. Roberto é o Sinatra brasileiro, como existe um Sinatra para os Estados Unidos, existe um Roberto Carlos para o Brasil. É um compositor que faz rock, faz música romântica, balada, mensagens religiosas e, tudo isso com muito sucesso.

* Quais são as suas primeiras lembranças do Roberto Carlos?
"MG" – Eu me lembro muito pouco do Roberto Carlos na Jovem Guarda, apesar de ter assistido a alguns programas. Mas eu ouvia muito pouco música quando criança. O meu interesse pela música começou muito tarde, comecei a tocar com vinte anos. A primeira grande lembrança que tenho do Roberto é já dos anos 70. A minha madrasta tinha um disco com a música “Amada amante” e de tanto ouvir o disco ele acabou furando. Então “Amada amante” é uma música que me marcou muito. Outra música que lembra a minha adolescência é “As curvas da Estrada de Santos”. O meu irmão era roqueiro e os roqueiros da época achavam algumas canções do Roberto Carlos um pouco bregas. Uma das poucas que eles gostavam era “As curvas da Estrada de Santos”. Essas músicas marcaram muito a minha adolescência.

* Será que aquele garoto que tocava em bares de Brasília um dia sonhou que gravaria com Roberto Carlos?
"MG" – Nunca! Eu já tive o privilégio de tocar com grandes nomes da música brasileira, graças a Deus com quase todos, mas confesso que tremi na hora de gravar com Roberto Carlos. Participar da gravação do projeto acústico foi demais! No dia em que foi confirmada a minha participação no Acústico eu saí contanto para todo mundo.

* Você também ficou ansioso esperando o lançamento do DVD?
"MG" – Bastante, porque eu ainda não tinha visto a minha participação, e o lançamento do DVD era super importante por causa da imagem. Uma coisa é você ouvir a sua participação no disco, outra é ver a imagem no DVD. Só quando eu vi é que percebi o quanto Roberto foi carinhoso comigo, agradecendo a minha participação e me aplaudindo durante algum tempo. Quando ouvia o disco eu ficava imaginando como teria ficado o DVD, torcendo para que ele fosse lançado, mas também com medo de que não fosse para as lojas. Quando vi a gravação em DVD gostei muito.

* Roberto já iniciou a gravação do novo disco. Existe alguma participação sua prevista no próximo CD?
"MG" – Não, ainda é cedo. Acho que o Roberto deve estar escolhendo as músicas e compondo. Ele só me chama no final das gravações. O solo é a última coisa que entra no disco. Quase sempre eu sou chamado depois que Roberto já colocou a voz. Como eu disse antes, ele considera o solo de qualquer instrumento como a continuação da voz. Eu tenho que ouvir toda a gravação para criar o solo. Com isso tenho o privilégio de ouvir o disco antes de ele ir para as lojas.

* Como você define Roberto Carlos?
"MG" – Eu conheço pouco o Roberto Carlos mas o pouco contato que tivemos dá para perceber que é uma pessoa muito simples, religiosa e generosa. Ele me abriu várias portas com a minha participação no seu disco acústico. Sempre mostrou muita humildade nas conversas que tivemos. Em todos os contatos ele me mostrou extremamente generoso.

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