PAULO SETTE
entrevista concedida a Carlos Eduardo F.Bittencourt para o
Grupo Um Milhão de Amigos

15.10.1997




Que o último disco de Roberto Carlos é o melhor dos últimos anos
e talvez mesmo o melhor de sua carreira ninguém duvida,
com muitas composições da dupla Roberto e Erasmo Carlos,
“Assunto Predileto”, de Eduardo Lages e Paulo Sérgio Valle,
e “O Homem Bom”, uma letra profunda, uma adaptação de texto de Roberto Carlos
para a composição de Paulo Sette e Clayton Querido.
Um disco de sucesso que veio dar a Paulo Sette
a grande alegria de pela primeira vez ter uma canção gravada por Roberto Carlos,
seu amigo há tantos anos.
Paulo Sette visitou a sede do Grupo Um Milhão de Amigos no dia 15 de outubro de 1997.
Para vocês, um pouco do que conversamos.

* Como você iniciou sua carreira de músico?
"PS" – Comecei em 1959, levado pelo Waldir, dos Golden Boys, ao Clube do Guri, na época em que era apresentado pela Rádio Tupi. Foi ali que eu conheci o Roberto. A gente se cruzava pelos corredores. Então passei a acompanhá-lo. Ele era uma pessoa persistente, lutadora, que estava tentando gravar um disco e sempre tentava cantar no programa do Paulo Gracindo, na Rádio Nacional. Um dia ele conseguiu entrar num dos quadros, o “Nova Geração”, e a partir dali começou a fazer sucesso. Ele cantou “Tutti-Fruti”, do Elvis Presley, e agradou ao auditório. Isso era um grande feito porque tudo era ao vivo. A gente já sentia um prenúncio no futuro do Roberto Carlos.

* Como era o Roberto Carlos no dia-a-dia?
"PS" – Ele sempre foi um conquistador de amizade, observador, disciplinado, atencioso com os amigos, cativante, piadista e um tremendo gozador. Roberto adora contar piadas, algumas bastante velhas, daquelas que todo mundo já sabe. Mas ele conta sempre de uma maneira muito divertida. Roberto é um eterno moleque, no bom sentido da palavra, um eterno garoto. Igual ao bombom “Garoto”, não fica velho nunca, é sempre um garoto.

* Depois do sucesso no programa do Paulo Gracindo, como a carreira seguiu?
"PS" – Dali para frente ele começou a participar de outros programas de auditório, já que fazer sucesso no programa do Paulo Gracindo era ter as portas abertas para outros programas. Roberto foi aos programas do Manoel Barcelos, do César de Alencar, do Chacrinha, e começou a derrubar todas as barreiras.

* O que você quer dizer com “derrubar as barreiras”?
"PS" – Na época havia um preconceito muito grande porque o Roberto era muito garoto, e fazer sucesso nos anos 60 era só para os grandes nomes da música, como Nélson Gonçalves, Cauby Peixoto e outros. Roberto Carlos ainda não tinha nem 20 anos quando começou a fazer sucesso.

* Você ser recorda de algumas pessoas que foram importantes para o sucesso do Roberto no início da carreira?
"PS" – Muitas pessoas... Mas a base musical do Roberto Carlos foi construída pelo maestro Astor, responsável pelos arranjos de seus primeiros discos. Depois veio o Pachequinho, que acompanhou Roberto nos discos até o final dos anos 60.

* Para você, a ascensão do Roberto foi meteórica?
"PS" – O grande ídolo da época era o Sérgio Murilo; Roberto já vinha fazendo “sombra”, como se dizia. Ele já estava incomodando o Sérgio. Roberto Carlos é amigo, tem muito carisma, é um grande profissional, então tudo isso contribuiu para sua ascensão. Outro fator importante é que ele seguia o exemplo dos cantores talentosos, sempre aprendendo o que eles tinham de bom para ensinar. Roberto era um dos poucos artistas da nova geração respeitado e considerado pelos ídolos daquela época.

* Por que eles tinham esse carinho pelo Roberto?
"PS" – Porque ele sempre foi simpático, gentil, hospitaleiro. Era persistente. Sua conduta e sua luta chamavam a atenção das pessoas. Ele ainda é o grande sucesso que é porque tem muito talento e carisma, uma grande estrela. Sempre foi um abençoado por Deus. A sorte também sempre o acompanhou. Todos esses fatores são fundamentais.

* Você tem conhecimento da época em que Roberto Carlos cantava em circo?
"PS" – Foi bem no início da carreira dele. Na época, para ganhar dinheiro era preciso cantar em circo. A televisão ainda estava engatinhando e não dava muito dinheiro. Os programas de rádio davam prestígio mas eram de graça. Roberto tinha um amigo, Pires, uma espécie de empresário, que ia nos circos conseguir shows para ele, e se apresentou em vários circos famosos, como o Stankovski, o Real Madrid e o Saca-Rolha.

* Quem o acompanhava?
"PS" – Quase sempre ele ia sozinho, com sua guitarra. Mas também ia acompanhado pelo Hélio Justo, que fez várias músicas para ele mas que na época tocava guitarra. Também havia o Luiz Henrique, do conjunto “The Blooding Rocks”, que houve é engenheiro. Ele já fazia parte da turma nessa época mas só um pouco mais tarde começou a tocar com Roberto nos circos.

* Você esperava que o sucesso do Roberto chegasse até onde chegou?
"PS" – Não, porque todo esse sucesso que ele tem hoje não estava nem mesmo nas suas previsões. O sonho dele era apenas o de cantar e gravar um disco, nunca o de chegar a esse fenômeno que é hoje. Mas como ele sempre foi, e é, muito inteligente, não é à toa que está na frente dos outros. E na frente não só em sucesso, mas em cabeça, porque é disciplinado, correto, não é falso, sua imagem é limpa e, acima de tudo, é verdadeiro.

* Você acha que ele fica incomodado por ter perdido a privacidade depois do sucesso?
"PS" – Ficar incomodado não, mas ele gostaria de ir a um cinema, de passear no mato, de andar de barco, coisas que ele não pode mais fazer. Antigamente ele pedia para eu comprar ingressos para a última sessão do cinema e passava na minha casa para me pegar. Tudo isso a gente viveu. Sua adolescência foi muito bem aproveitada. Mas ele não podia ir contra todo esse sucesso que ele faz. Para mim isso é coisa do destino.

* Para você qual foi o momento mais marcante e decisivo na carreira do Roberto?
"PS" – Acho que foi o Festival de San Remo, que ultrapassou todas as previsões. Roberto já passou por três fases em sua carreira: adolescência, carreira adulta e maturidade total. Agora, ao cantar para o Papa, com 2 milhões de pessoas no Aterro do Flamengo e mais de 60 bilhões de telespectadores, Roberto provou mais uma vez o fenômeno que é. Seu sucesso é constante.

* Por que Roberto faz tanto sucesso, é tão querido pelo público e às vezes até agredido pela crítica?
"PS" – Esse pessoal da imprensa pensa que é o termômetro do comportamento popular. Não é nada disso. O povo é que tem sentimento e ninguém manda no sentimento popular. O povo sabe o que é bom ou ruim. Não adianta querer impor nada ao povo como parte dos jornalistas quer fazer e não consegue. O povo ama Roberto Carlos.

* Você acha que a atenção que Roberto tem com tudo o faz captar esse sentimento popular?
"PS" – O pouco tempo que a gente conversa com Roberto Carlos nos parece uma eternidade de tão rica é a conversa. Ele sabe o que você está falando, ele te olha de uma forma diferente e tem uma energia muito positiva. Roberto é bondoso, acima de tudo, com quem merece a bondade. Ele encontra muitas dificuldades no caminho mas sabe superar tudo. Esse pessoal que o critica não tem a metade da vivência dele; se dizem intelectuais mas muitas vezes são fugitivos dos bancos escolares. Nenhum deles pode falar mal do Roberto porque não entende um décimo do que Roberto entende de música e de gravação. Ele já está há mais de 35 anos provando que é o melhor, que está à frente do nosso tempo. Ele é o resultado dos Beatles, do Elvis Presley, do Frank Sinatra juntos mas muito melhor que eles por causa do seu comportamento no dia-a-dia.

* Roberto seria o Homem Bom da sua música?
"PS" – É mais do que bom, é um super-homem, porque para passar todos esses anos fazendo sucesso, com mais de 500 canções, ajudando tantos cantores, compositores, músicos, radialistas, tem mesmo que ser especial. É um caso único no mundo. Roberto é um caso estranho, muito estranho, não tem ninguém igual.

* Por que com essa amizade de mais de 30 anos, só no ano passado Roberto Carlos gravou uma música sua?
"PS" – Já entreguei várias músicas a ele. Nos anos 70, durante uns 5 anos eu entregava músicas sempre que ele começava a gravar um disco. Mas como eu morava no Rio e ele em São Paulo, tudo ficava meio complicado. Quando eu ia para São Paulo ele estava no Rio; quando o procurava no Rio já tinha voltado para São Paulo. Eu desisti. Nos anos 60 houve uma música minha que quase foi gravada por ele.

* Vamos falar agora da música “O Homem Bom”, como nasceu a ideia da música?
"PS" – O nome original era “Viver é ser bom”, um pensamento de Sócrates. A ideia era falar de um mensageiro de Deus, disfarçado de carteiro, de viajante, de andarilho... O personagem nunca ficou bem definido mas falava de alguém que fazia o bem, sem ligação religiosa.

* Como você e o Clayton Querido trabalharam na música?
"PS" – Nós trabalhamos juntos tanto na melodia como na letra.

* De quem foi a ideia de homenagear o Papa?
"PS" – Foi do Roberto. No mundo ocidental, o Papa é o mensageiro de Deus, o mensageiro do bem que sempre esteve presente nos conflitos mundiais. Mesmo em outras religiões surgiu sempre como pacificador. Então, foi muito importante essa mudança que Roberto fez.

* Como foram feitas as mudanças?
"PS" – Foram várias mudanças. Eu devo ter umas 10 letras diferentes de “O Homem Bom”. A ideia de homenagear o Papa surgiu no processo final do trabalho. Essa música foi entregue ao Roberto há uns 6 anos. Antes dela entreguei a música “Força dos ancestrais” mas Roberto não gostou muito e me pediu outra, que foi “O Homem Bom”, ainda com o nome de “Viver é sem bom”. E ela ainda teve outros nomes, como: “Valores da vida”, “O carteiro”, “Força iluminada”... Até que ele escolheu “O Homem Bom” para homenagear o Papa que vinha ao Rio. Um dos títulos também sugerido foi “O Homem” mas o Roberto o descartou porque já tinha uma canção com esse nome, gravada em 1973.

* Por que Roberto não cantou essa música para o Papa?
"PS" – Eu acho que ele preferiu “Nossa Senhora” e “Jesus Cristo” porque já são mais conhecidas do povo. Mas fiquei muito feliz quando a Vera me disse que “O Homem Bom” foi cantada por um coro de alunos de escolas municipais quando o Papa deixava a Catedral Metropolitana após a missa.

* Voltando às mudanças. Elas foram feitas apenas na letra ou também na música?
"PS" – Só na letra. A melodia é inca, do Deus-Sol, e o arranjo do Tutuca. É muito parecido com o que Clayton fez. Tutuca conversou com a gente e disse que apenas fez umas pequenas mudanças e transcreveu para outros instrumentos. Ele nem queria assinar o arranjo.

* Quando resolveram que a música estava pronta?
"PS" – Ainda em 95 mas Roberto preferiu deixá-la para o ano da vinda do Papa ao Rio. No fundo ele sempre quis homenagear João Paulo II com a letra.

* Você não acha que a gravadora poderia ter divulgado mais essa música aproveitando a visita do Papa ao Rio?
"PS" – Fui muito procurado pelas rádios, muito bem recebido, mas a gravadora não fez nenhuma divulgação, nem mesmo um mix distribuíram para as rádios. Foi uma pena. Como foi feita para o Papa e nos últimos meses só se falava nessa visita, com certeza a música teria sido muito tocada.

* Quando você soube que Roberto a gravaria no disco de 96?
"PS" – Sempre ficava aquela expectativa. Pensava se não seria um rebate falso. Para mim, se Roberto não a gravasse no ano passado jamais a gravaria. Foram cem palavras mudadas nesses 6 anos em que trabalhamos na canção. A expectativa era grande.

* Com tantas mudanças, a música gravada tem alguma coisa parecida com a original?
"PS" – Tem, porque eu mudava e às vezes o Roberto voltava a uma letra antiga. A gravação que está no disco é muito parecida com a segunda letra. A música nunca perdeu a linha que eu e o Clayton queríamos seguir.

* Quando você ouviu a gravação pela primeira vez?
"PS" – Poucos dias antes do lançamento do disco os divulgadores levam uma prova aos atacadistas para que possam ter uma ideia do trabalho. Foi na loja de um amigo que ouvi a gravação. Roberto havia me dito que estava gravada mas eu não acreditava muito pois é comum ele mudar de ideia.

* Qual a sua opinião sobre o disco de 96, considerado por muitos como um dos melhores da carreira do Roberto Carlos?
"PS" – Pelos lojistas e pelas emissoras de rádio é considerado o melhor dos últimos 10 anos sob todos os aspectos: letras, arranjos, ideias, interpretação, temas. Roberto foi muito feliz em tudo, e me sinto muito feliz por estar participando desse disco, a maior realização da minha vida.

* Ele tem outras músicas suas para gravar?
"PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – "PS" – vvDeve ter umas 8 no mesmo nível ou até melhores. São mensagens parecidas com a de “O Homem Bom”. Agora, não sei se algum dia irá gravar alguma.

* Qual a música religiosa gravada pelo Roberto de que você mais gosta?
"PS" – “Ele está pra chegar”. Essa música tem umas passagens muito interessantes.

* E de todo o repertório do Roberto, qual a sua preferida?
"PS" – “Tudo pára”. É muito bem construída.

* Paulinho, agradecendo sua visita, como você se sentiu aqui na sede do Grupo Um Milhão de Amigos?
"PS" – Fico muito feliz por estar aqui. Não pode imaginar a satisfação de conhecer vocês, que me passa, um astral maravilhoso de pessoas bem humanas e fraternalistas. Olha, se Roberto anda não conhece tudo isso aqui ele tem é que vir logo conhecer. Digo a ele: Venha logo! Essas poucas horas que passei com vocês me passaram muito bem a imagem do Roberto Carlos. Isso aqui é um prosseguimento da carreira dele.

* Como você define Roberto Carlos?
"PS" – Popular, para mim, e tudo que cai no gosto do povo. Popular é Roberto Carlos. Tudo passa por ele, que é o mais sensível, o mais inteligente e, sem dúvida, representa os mais puros sentimentos do povo brasileiro na sua alma e no seu dia-a-dia. Roberto Carlos é o filho, o amigo, o irmão que todos procuram. Vai servir de exemplo a muitas gerações. Seus gestos simples e fraternalistas são iluminados por Deus.

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