ROBERTO CARLOS
Transcrição: Carlos Eduardo F.Bittencourt para o
Grupo Um Milhão de Amigos

1986




Nos anos 80 a TV Globo exibia pela manhã um programa voltado para o público feminino
e em um de seus quadros a atriz Irene Ravache
entrevistava personalidades famosas da cultura brasileira.
É claro que Roberto Carlos esteve presente.
Vamos relembrar aqui a conversa entre eles,
uma conversa cheia de emoção ao mesmo tempo bastante descontraída.

* IR – Não podia ser diferente, eu estou nervosa, estou emocionada, estou “um monte de coisa” porque vou entrevistar o Rei! Eu vou entrevistar o Rei Roberto Carlos! Mamãe, me belisca! A gente tem vinte e dois anos de profissão, vai ganhando prêmios, fazendo uma série de coisas, mas estou extremamente nervosa quando me sento perto de quem sou fã. E fico tudo isso que falei, Roberto.
"RC" – Eu sei exatamente, também é isso que estou sentindo... Quando me falaram que era você quem iria fazer a entrevista eu disse: O que? Eu tenho que começar a me preparar desde agora, psicologicamente, em tudo.

* IR – Roberto, eu quero perguntar tudo o que tenho direito. A pulseira é a mesma? Você sabe que isso é um símbolo para a gente? Sempre que vamos a um show o olhinho vai lá no seu braço para ver a pulseira.
"RC" – É a mesma, a mesma que o Evandro Ribeiro tinha na mesa dele, há muito tempo, e que eu gostei e pedi. Mas ele disse que não podia me dar porque a pulseira era francesa. Mas um dia me deu.

* IR – Roberto, as pessoas te cobram muito? Como você encara isso?
"RC" – Como uma coisa natural. Cobram a minha opinião em relação a política, cobram mudanças nas coisas que eu faço... Esse tipo de cobrança sempre tem.

* IR – Por que acham que para fazer política tem que se apoiar algum partido ou algum candidato?
"RC" – Eu não sei não, eu não sei. Só sei que para mim é muito difícil dizer “essa é a pessoa certa”, “vote em fulano de tal”. É muito difícil porque a responsabilidade do artista, e de qualquer pessoa de vida pública, é muito delicada. É uma responsabilidade muito grande dizer “fulano é a pessoa certa”. Eu só direi isso realmente no dia em que tiver a absoluta certeza, conhecer a pessoa a fundo para dizer “esse é o homem certo para esse cargo”. Então acho, inclusive, que o artista tem que ter muito cuidado com a opinião dele em relação a essa ou àquela pessoa que ele vai recomendar ao público. Como não entendo muito de política, é por isso que eu fico um pouco “na minha".

* IR – No tempo da Jovem Guarda, quando você usava cabelo e roupa ousados para a época, você era visto pelos pais com certa estranheza. Como você vê hoje a juventude?
"RC" – Vejo a juventude com muita preocupação, e é por isso que converso muito com meus filhos e procuro ter um diálogo super aberto com eles, porque a minha preocupação é grande. A gente vê muitas coisas acontecendo, coisas que me preocupam, até mesmo na televisão, como programas que não deveriam ser exibidos em determinados horários. Seria bom se os nossos filhos fossem poupados de tudo isso. São espetáculos e tipos de informações até negativas para a educação dos jovens. Eu fico muito preocupado com isso, e essa preocupação me leva cada vez mais a ter um diálogo com meus filhos, falar com eles sobre tudo que eu acho que é perigoso, delicado, principalmente para que eles possam entender que determinadas coisas não são certas.

* IR – Você tem noção do que representa o teu positivismo para as pessoas, essa coisa boa que você passa?
"RC" – Eu não sei o que é isso. Eu trato de fazer as coisas direitinho, procuro fazer bem feitinho os meus discos, os meus shows, entende? Agora, não sei o que é isso. Gosto de falar coisas boas, da religiosidade, da espiritualidade, do amor, da paz.

* IR – Você é ciumento?
"RC" – Ciúme do tipo doentio, esse eu não tenho, não. Meu ciúme é um ciuminho bonitinho, normal, mas sem aquela cobrança. Meu ciúme não tem aquele tipo de pergunta: Onde você foi... o que você fez... a que horas você saiu... a que horas você vai chegar. Isso não é legal numa relação.

* IR – Você sabe quando uma pessoa se aproxima deixando de olhar o ídolo e se interessando pelo ser humano?
"RC" – Sei, sinto sim.

* IR – Parabéns porque eu fico me perguntando e percebo que muita gente já perdeu essa sensibilidade de sentir. Eu acho que é porque você ainda está ligado nas coisas mais simples e mais próximas das pessoas.
"RC" – Eu presto muito atenção a tudo do ser humano, a tudo que acontece a minha volta. Eu sou muito atento e gosto de conhecer as pessoas. No primeiro momento da presença de uma pessoa eu procuro muito olhar dentro dela.

* IR – Você tem amigos de infância?
"RC" – Tenho, inclusive uma coisa que quase sempre sinto muito é saudade de algumas pessoas amigas lá de Cachoeiro, de Niterói e até mesmo do Lins de Vasconcelos, onde morei. Eu tenho muito daquele tipo de pensamento. Puxa vida, nunca mais vi fulano! Acontece muito eu pensar nos amigos que há muito tempo eu não vejo. Eu penso muito neles e às vezes dá muita saudade.

* IR – O que faz quando fica em casa?
"RC" – Depende, depende do que me dá vontade na hora. Nunca tenho nada programado, tipo vou fazer isso, vou fazer aquilo...

* IR – E quando bate a solidão?
"RC" – Quando bate a solidão dá vontade de fazer música.

* IR – Ainda é o caminho mais forte para você?
"RC" – É um dos caminhos fortes, porque a solidão causa uma concentração, uma reflexão muito grande, e me dá vontade de botar tudo isso para fora. É a minha forma mais direta de botar as coisas para fora, de dizer o que sinto.

* IR – Como você transa a solidão?
"RC" – Eu transo muito bem a solidão, acho que é por causa da música. Mas a solidão me leva também a pensar muito nas minhas coisas, nas coisas da vida, me leva a fazer uma análise geral.

* IR – Roberto, antigamente você fumava cachimbo e agora parou. Por que fumar cachimbo?
"RC" – Eu comecei a fumar cachimbo porque achava charmoso e cheguei até fazer coleção de cachimbo. Mas chegou um momento em que percebi que estava fumando demais e queria fumar menos. Mas é muito difícil fumar menos e achei que era mais fácil parar de fumar. Eu parei com o cachimbo mas não o substitui por outro vício.

* IR – Você bebe, Roberto? Já tomou um porre?
"RC" – Eu bebo socialmente, gosto de beber vinho e um whiskinho. Mas quando digo um, é um mesmo. Mas já tomei um porre, ah, já...

* IR – E como é que você fica? Fica mais alegre?
"RC" – Fico bêbado, ora... Já tomei alguns pilequinhos, mas foram poucos porque eu passo muito mal quando estou de pileque, não fico bem, não. Mas eu não sou de beber muito, não. Apesar de tomar um whiskinho, principalmente nos shows, não gosto muito de whisky. Dá para entender? E você pode reparar que nos shows sempre depois do whisky eu tomo um gole de água. Eu acho legal e até acredito que seja uma coisa automática.

* IR – Para terminar, eu queria que você mandasse um recado para um jovem que está tentando começar a sua carreira. Vamos dizer que ele mora lá no interior do Espírito Santo e enfrenta uma enorme dificuldade no mercado de trabalho. O que você diria para ele?
"RC" – Que o otimismo, a esperança e a fé em Deus são o caminho mais certo. Então ele tem que ter muita fé em Deus, autenticidade, humildade sobretudo, isso é muito importante. Eu acho que a humildade é o mais importante em todos os lances. E a força de vontade, trabalho, trabalho mesmo. E bom senso. É uma porção de coisinhas assim, isso que eu posso dizer.

* IR – Muito obrigada por estar aqui com você, mas acima de tudo por fazer parte de uma geração que te conheceu.
"RC" – Ah, Irene, obrigado, meu amor, muito obrigado. Eu é que agradeço a você. Foi um bate-papo gostosíssimo. Eu é que fiquei nervoso quando soube que era você quem iria me entrevistar. Muito obrigado e um beijo grande para todos.

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