ROBERTO CARLOS
Transcrição: Carlos Eduardo F.Bittencourt para o
Grupo Um Milhão de Amigos

1988




Roberto Carlos é Papo Firme e é por isso que o Grupo Um Milhão de Amigos
tem em seu acervo entrevistas às rádios de todo o país.
Vamos relembrar o que Roberto disse na Rádio RPC, do Rio de Janeiro, à repórter Karla Paes Leme, em 1988.

* Como é Roberto Carlos fora do palco, como pai e marido?
"RC" – Como pai sou muito amigo dos meus filhos. Nós nos damos muito bem, temos um relacionamento maravilhoso de muito respeito. Somos amigos mas sem que eles esqueçam de que eu sou o pai deles, e que há horas que temos que colocar a autoridade de pai junto ao amigo. Como marido temos um relacionamento muito bom, uma coisa muito bonita e de muito amor.

* E como amigo? Fale um pouco dessa amizade com o Erasmo?
"RC" – Minha amizade com Erasmo é muito grande e muito despreocupada. É aquela amizade em que um confia no outro e nenhum dos dois se preocupa de se falar com freqüência pelo telefone para manter o contato. Há épocas em que a gente se fala muito e em outros nos falamos pouco. Quando começamos a compor, no fim de cada ano, eu e o Erasmo nos falamos bastante. Depois, mesmo por causa de viagens e shows, o contato diminui. Mas isso é coisa normal na nossa amizade, porque ela é tão firme e tão sólida que essa falta de contato não faz diferença. Já houve época de um ligar para o outro no dia do aniversário cobrando os parabéns, porque o dia já estava terminando e não tínhamos nos falado. Mas tudo numa boa.

* Qual a importância da religiosidade na sua vida?
"RC" – Isso é uma coisa que vem desde criança. Minha mãe sempre foi muito religiosa e quando criança eu ia à missa com ela. Comecei os meus estudos num colégio de freiras. Enfim, quem me conduziu ao catolicismo foi minha mãe. Então e religiosidade foi se desenvolvendo na minha vida de maneira natural. Hoje sou eu homem muito religioso e espiritualizado.

* Como convivem a sua religiosidade e as suas superstições?
"RC" – Não sou tão supersticioso como muitos falam. É a mesma coisa do ciúme. Inventam muito. Eu tenho algumas manias, como sair sempre pela porta que entro. Não gosto de usar marrom, mas não é verdade que exijo que as pessoas não usem marrom perto de mim. Tem muita invenção nessa história.

* Você associa as cores com seu estado de espírito?
"RC" – Não, eu ando muito de azul, eu visto muito roupas azuis, então nem posso dizer que coloco roupas de acordo com o meu estado de espírito.

* Então a cor do seu sucesso é azul?
"RC" – Não sei se o azul tem a ver com o meu sucesso. Eu só sei que tenho que agradecer muito a Deus pelo que tem me acontecido, e o meu sucesso eu devo a Ele.

* O sucesso também tem coisas ruins?
"RC" – Eu só tive coisas boas com o sucesso. Se por um lado eu não tenho muita liberdade, existem muitas outras coisas que compensam. São coisas que tenho que entender. Sei que os fãs não me deixariam caminhar tranqüilo pela rua. Isso tem um lado positivo porque mostra o carinho que as pessoas têm por mim. O motivo dessa falta de liberdade é uma coisa tão bonita que convivo com isso muito bem. A fama também facilita em muitas coisas. No fundo o artista fica mais feliz por ser mimado pelo público por causa do sucesso que faz.

* Você é vaidoso?
"RC" – Não, a minha vaidade é algo muito natural, como a de estar bem arrumado, com uma roupa bonitinha, coisa desse tipo.

* Você se sente orgulhoso do seu trabalho?
"RC" – Sim, mas eu sou mesmo é agradecido a Deus por tudo isso, por tudo que conquistei.

* Como é o seu relacionamento com a crítica?
"RC" – Nosso relacionamento é muito bom, porque tenho certeza de que faço o meu trabalho de maneira consciente, mesmo sabendo que não irei agradar a todos. Mas para mim o importante é saber que faço meu trabalho de acordo com o gosto popular. Existe uma cobrança muito grande em relação a mudanças nas minhas músicas, mas eu tenho a minha consciência tranqüila de que estou fazendo o que eu gosto e que tenho o meu estilo. As mudanças que eu faço são sempre de acordo com o meu estilo. Eu não posso pensar em grandes alterações que irão modificar o meu estilo, e às vezes isso não satisfaz determinados críticos. Mas eu fico tranqüilo. Grande modificações na maneira de cantar e de compor não vou fazer. Não seria certo e nem de bom senso mexer naquilo que canto há tanto tempo.

* Você é muito crítico com seu trabalho?
"RC" – Eu me considero bastante crítico com o que faço. Eu gosto e procuro fazer as coisas bem feitas, de uma forma correta. Por isso, a partir do momento que tenho essa consciência de que procuro fazer o melhor, é que tenho um bom relacionamento com a crítica.

* Roberto, você é muito cobrado sobre questões sociais?
"RC" – Em algumas coisas, sim, mas em relação à ecologia até que não. Graças a Deus eu tenho estado bastante próximo dessa preocupação ecológica que acontece em todo o mundo e até já gravei várias músicas sobre o tema.

* Você ouve os seus discos?
"RC" – Muito pouco. Eu ouço os meus discos quando eles são lançados, para ver como ficaram, para fazer uma crítica do trabalho, ver o que eu gostaria de mexer, o que poderia ter ficado melhor. Depois do lançamento ouço muito pouco. Às vezes pego meus filhos ouvindo os discos mais antigos e aí dou uma paradinha para ouvir junto com eles.

* Você sempre fica satisfeito com o resultado final dos seus discos?
"RC" – Em todos os discos sempre tem alguma coisa que eu gostaria de fazer novamente, mesmo que eu repita muito tudo o que faço. Fico meses no estúdio, mas sempre acho que tem algo que poderia ser mudado. Há determinadas músicas que fico horas e horas gravando, e várias vezes. No fim chego à conclusão de que a primeira gravação é que está melhor. Isso acontece muito.

* Como é a sua participação na produção de um disco?
"RC" – Em tudo, tudo mesmo. No meu disco eu dou palpite no trabalho do produtor, na parte dos músicos, dos maestros, dos técnicos. Até na produção da capa com o diretor artístico e com o fotógrafo.

* É você quem escolhe a música de trabalho nas rádios ou fica a critério da gravadora?
"RC" – Em sempre tenho uma ideia do que deve ser trabalhado nas rádios, e isso tem coincidido com as músicas que a gravadora escolhe. A música de trabalho sempre sai de uma relação de três músicas que eu acho que deveriam ser trabalhadas.

* Por que desde o disco “O inimitável” os seus discos não tiveram mais um nome?
"RC" – Não existe nenhum motivo especial. Da mesma forma que os lançamentos dos discos nos finais de ano também foi algo natural, não foi nada planejado. No início da minha carreira eu cheguei a lançar mais de um disco por ano. Num determinado ano, gravei um disco e oito meses depois lancei outro, que foi para as lojas no início do ano. Quando voltei a gravar houve a coincidência de ele ser lançado no final do ano, e a partir daí cheguei à conclusão de que deveria gravar só um disco por ano. Aí fiquei gravando sempre na mesma época e lançando no final do ano. Com o tempo percebi que lançar um disco por ano é algo conveniente, e a maioria dos artistas também adotou esse procedimento.

* Há alguma música preferida nesse último disco?
"RC" – Em sempre gosto muito da mensagem do disco e neste eu gosto de “Todo mundo é alguém”. Eu trabalho com carinho em todas as músicas mas eu tenho uma preocupação maior com as mensagens e há anos que faço questão de gravar esse tipo de canção. É um estilo de música que curto muito.

* Fale um pouco de “Todo mundo é alguém”.
"RC" – Erasmo e eu fizemos pensando nas pessoas que fazem determinados trabalhos que não são muito valorizados. Quando um prédio é construído muitos falam do engenheiro, do arquiteto, mas ninguém se preocupa com o operário que levantou aquele prédio. É ele quem coloca o tijolo, coloca a massa. Então falamos da importância que deve ser dada a esse homem. O operário da obra foi o personagem em que mais pensamos quando estávamos compondo a canção.

* Quais das suas músicas são as suas preferidas?
"RC" – A que gosto mais é “Detalhes”. Também gosto muito de “Emoções”, de “As baleias” e de outros.

* Por que “Detalhes” é a sua preferida?
"RC" – Não sei dizer o porquê dessa preferência. De repente é por ser uma música que toda vez que eu canto e que eu ouço me causa a mesma emoção de quando a fiz e cantei pela primeira vez.

* Como é a história dessa música. Como ela foi criada?
"RC" – Da imaginação. É lógico que quando eu e o Erasmo fazemos uma música sempre colocamos uma história que vivemos, que a gente imagina ou que ouvimos alguém contar. Mas sempre enriquecemos um pouco essa história. “Detalhes” é uma música que foi feita de todas essas coisas um pouco de verdade, um pouco de imaginação, um pouco de enriquecimento na letra. Seja como for que ela tenha sido feita e os porquês, “Detalhes” sempre me fala de uma verdade atualizada. É uma canção muito particular, pois eu a fiz há tantos anos mas me parece muito atual, sempre.

* Há algumas músicas de outros compositores que você pretende gravar?
"RC" – “O que será”, de Chico Buarque, “Dindi”, de Tom Jobim e Aloysio Oliveira, “Fim de caso”, da Dolores Duran e outras.

* Tem alguma música que você gostaria que fosse gravada por determinado cantor ou cantora?
"RC" – Às vezes quando estamos compondo percebemos que algumas músicas têm o jeito de determinado artistas, e ficamos pensando como ele, ou ela, a cantaria. Mas, realmente, eu não sei dizer se há alguma música que eu tenha feito e que depois tenha pensado em ouvi-la gravada por outra pessoa. Mas sempre que alguém grava uma música minha eu falo: Puxa, que maravilha, ele escolheu a música certa para jeito dele!

* Em relação à música “Amiga”, que você gravou com a Maria Bethânia, você pensou realmente nela?
"RC" – A primeira pessoa que pensei para cantar comigo foi a Bethânia. Eu posso até ter pensado depois em outras cantoras, mas quando a fiz pensei logo nela. Eu não sei se quando iniciei a música eu pensava em dividi-la com alguém. Acho que a partir de um certo ponto é que percebi que a letra iria se desenvolver daquela forma, para se formar um dueto. Eu já tinha falado tudo para a amiga, e aí eu queria saber o que a amiga diria para mim. Foi aí que pensei na Bethânia.

* E por que a Bethânia?
"RC" – Pelo seu tipo de interpretação e seu tipo de voz. A forma que imaginei a música cantada foi com o estilo da Bethânia, e fiquei super contente com o resultado. Tudo que pensava escutar com a Bethânia cantando aconteceu, e o resultado final ficou melhor do que eu imaginava. Foi uma grande alegria tê-la no meu disco.

* Você costuma fazer planos?
"RC" – Faço, sim. Faço planos, tenho sonhos e às vezes dos meus sonhos vêm os planos. Dessas coisas que fico pensando e que nascem as músicas, nascem os sonhos, os projetos.

* E os filmes, não pensa voltar a fazê-los?
"RC" – Desde que fiz o último filme, em 1971, tenho pensado em fazer outro. Mas a partir daquela época eu comecei a viajar muito, a trabalhar muito e também passei cada vez mais a participar de todas as coisas que hoje faço. Nos filmes que fiz eu participei muito pouco da produção e do roteiro, o que não faria hoje. Eu ouvi a história, gostei e comecei a filmar. Hoje em dia seria diferente, eu iria dar palpite na história junto com o autor, ia me meter no roteiro, tudo passaria pelas minhas mãos. Só que o meu tempo hoje é bem menor do que era antes. No ano passado eu cheguei a conversar com o Roberto Farias, tivemos algumas reuniões com o Doc Comparato para escrever a história. Mas tudo demorou muito na escolha da história e na aprovação dela, e aí não deu mais tempo para filmar porque já estava na hora de iniciar a gravação do disco.

* E existe o risco de quando você for rever a história mudar tudo de novo?
"RC" – Existe, sempre existe esse risco, sim.

* Então pelo visto a gente não vai vê-lo tão cedo nas telas...
"RC" – Não é bem assim. De repente eu até faço um filme. Quando tiver uma história com uma mensagem muito boa eu acho que volto a filmar. Esse filme que pensava fazer, com o texto do Doc Comparato e a direção do Roberto Farias, seria uma mensagem contra as drogas, e por isso era uma história difícil de se desenvolver abordando todos os pontos importantes. Mas um dia pretendo fazer um filme falando desse assunto, procurando alertar as pessoas para o problema das drogas. Também pode acontecer de abordar algum outro assunto.

* Como você observa a situação política do Brasil?
"RC" – Eu não gosto de falar muito desse tema porque não sou um entendido no assunto. Política é uma coisa muito complicada, tão complicada que para falar isso a pessoa tem que entender muito. Negócio de política realmente não é comigo. Agora, a situação do país é essa que a gente vê. Nem tenho que fazer comentários, porque iria repetir o que todo mundo já tem falado. O que escutamos nas ruas é que a situação do Brasil é delicada. Nós temos que colaborar para ajudar nosso país a dar certo porque será muito bom para todos.

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